Ante o peso das evidências, a organização defende-se por enfatizar que abandonou a piramidologia em 1928 - o que é verdade. Contudo, é difícil aceitar - de acordo com a doutrina atual das Testemunhas de Jeová - que, durante o assim chamado período de inspeção de Jesus Cristo (1914 - 1918), tenha ele dado seu 'carimbo' de aprovação aos 'Estudantes da Bíblia', fazendo 'vista grossa' a um envolvimento tão patente com aquilo que a organização hoje chama de 'satânico'.
A postura do 'pastor' Russell para com a astrologia era um tanto contraditória. Muito embora não a advogasse explicitamente - e até a contestasse - ainda assim, lançou mão, em certas ocasiões, de um linguajar tipicamente astrológico. Não era uma coisa rara entre os adventistas, com os quais Russell associou-se regularmente. Um exemplo clássico desse período se encontra na revista Zion's Watchtower [Torre de Vigia de Sião] de 1/5/1903, págs. 130 e 131 (em inglês):
“Nós questionamos seriamente todas as declarações da astrologia; ainda assim, o que se segue - qualquer que seja a fonte das sugestões, até mesmo do próprio adversário - parece marcadamente verdadeiro quanto às nossas expectativas baseadas na Palavra do Senhor. Apenas por essa razão nós o publicamos como segue:... Quando Urano e Júpiter se encontrarem no signo benigno de Aquário em 1914, a era há muito prometida terá tido um belo começo na obra de libertar os homens na busca de sua própria salvação e assegurará a realização final dos sonhos e ideais de todos os poetas e sagas da História."
Aqui, vemos o uso das posições astrológicas como instrumento de persuasão quanto à correção dos cálculos de Russell, os quais apontavam para a presença de Cristo desde 1874 e para 1914 como a data do 'fim do mundo'. É também digno de nota que o 'pastor', mesmo reconhecendo que tais declarações podiam provir do 'adversário' - presumivelmente, o diabo - ainda assim, tenha se sentido à vontade para publicá-las simplesmente por estarem em sintonia com suas 'expectativas'. Nesse caso, indagamos: se o leitor examinasse um artigo falando do "signo benigno de Aquário" e das posições de 'Urano' e 'Júpiter', teria alguma dúvida quanto à natureza do assunto? Não encontramos tais expressões até hoje nos horóscopos? Entretanto, isso não é tudo...
Caso uma pessoa comparecesse ao 'Fotodrama da Criação', veria o seguinte quadro:
Neste slide vemos representadas todas as posições do zodíaco. Elas serviam como reforço para as previsões futurísticas de Russell. Na verdade, a escatologia dos 'Estudantes da Bíblia' consistia em um 'tripé' - as profecias bíblicas, as medidas da pirâmide e as posições dos astros. O fascínio por estes últimos não terminaria aí.
O 'pastor' já havia publicado, anos antes, seu terceiro volume da série 'Estudos das Escrituras'. Nele, Russell citava Joseph Seiss, um pastor luterano - adepto da piramidologia e da astrologia - o qual publicou, em 1877, a obra O Milagre em Pedra ou a Grande Pirâmide do Egito. A citação dizia:
"Alcyone, então, tanto quanto a ciência tem sido capaz de discernir, pareceria ser 'o trono da meia-noite', no qual todo o sistema de gravitação tem sua base central e de onde o Todo-Poderoso governa o universo.".
Qual o significado dessas palavras? Vejamos...
Em 1915, a revista Zion's Watchtower de 15 de junho (p. 185) publicou um artigo mais pormenorizado sobre o tema:
"... a Ciência Declara que há um Centro muito mais poderoso, ao redor do qual estes incontáveis milhões de sóis giram, acompanhados por seus planetas e satélites. Este grande Centro parece estar associado com as Plêiades, particularmente com Alcyone, a estrela central desse renomado grupo. Por essa razão, tem se sugerido que Plêiades pode representar a Residência de Jeová, o lugar de onde Ele governa o universo. Este pensamento dá nova força à pergunta que o Todo-Poderoso fez ao patriarca Jó: ' És tu que atas as doces influências de Plêiades, ou soltas os laços de Órion? Podes fazer sair as constelações do zodíaco em suas estações?' - Jó 38: 31,32 Parece haver menos estrelas no Norte do que em qualquer outra parte dos céus. De modo que o Norte parece ter recebido uma posição muito proeminente... Nas Escrituras, o Norte parece associado bem de perto ao governo de Jeová sobre a terra."
O artigo acima refere-se à crença de que Deus habitava uma estrela - Alcyone - a qual pertencia à constelação de Plêiades. Além disso, um ponto cardeal - o Norte - recebia igual destaque. Como vimos, Russell não foi nada original, tendo tomado emprestadas as idéias de um pastor luterano - Joseph Seiss - o qual, por sua vez, as obteve de um escritor anterior a ele, Piazzi Smyth, já mencionado em nosso artigo. É interessante que Russell recorresse à Bíblia a fim de reforçar essas teorias. Causou-lhe, sem dúvida, enorme empolgação a determinação do 'endereço' de Deus. Anos à frente, em 1925, a edição de 15 de agosto da revista A Idade de Ouro [atualmente Despertai!] afirmaria que a cidade celestial de Sião também estava associada à estrela principal de Plêiades.
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"Plêiades" - a 'casa' de Jeová? |
O sucessor de Russell - J. F. Rutherford - herdou de seu mestre o gosto pelos astros. Uma prova disso foi o artigo que ele lançou já na edição de 10 de setembro de 1924 de A Idade de Ouro [atualmente Despertai!], pp. 793 e 794, o qual dizia:
"... a posição de Plêiades ao tempo da conclusão da Grande Pirâmide do Egito, a 'Testemunha de Pedra de Deus', é uma proeminente característica desta construção no centro da terra do Egito. Por essa e outras razões, os 'Estudantes da Bíblia' têm boa razão para crer que na região de Plêiades está localizado o trono de Jeová Deus... Se algum lugar no espaço, dentro de Plêiades, é o trono de Deus, então esse grupo é merecedor de nosso mais reverente estudo."
Aqui são endossadas as idéias do mesmíssimo autor que Russell destacara em seus artigos - Joseph Seiss. Pelo visto, a empolgação com os corpos celestes continuava de vento em popa na sede dos 'Estudantes da Bíblia'.
Muito embora Rutherford levasse ainda mais quatro anos para discernir o que outras instituições cristãs há muito já percebiam - o caráter profano da piramidologia - o 'reverente estudo' em torno de Plêiades perduraria por mais trinta anos - até 1953, quando uma publicação da Sociedade Torre de Vigia admitiu que ver uma estrela como o 'trono de Deus' poderia levar a uma 'veneração' pelos corpos celestes. Dessa forma, mais um capítulo embaraçoso da história das Testemunhas de Jeová era selado - mas não para sempre.
Toda essa excitação em torno dos astros, por mais de meio século, remete-nos à passagem bíblica em Deuteronômio 4: 19:
"Quando levantares os olhos para o céu, e vires o sol, a lua, as estrelas, e todo o exército dos céus, guarda-te de te prostrar diante deles e de render um culto a esses astros..."
Sem dúvida, o dia 31 de outubro de 1916 caiu como uma bomba sobre a comunidade de 'Estudantes da Bíblia'. Naquela data fatídica, seu mestre C. T. Russell exalou o último suspiro a bordo de um trem no Texas. Segundo o livro Proclamadores, p. 64, um clima de profundo pesar e desorientação abateu-se sobre os membros da Sociedade Torre de Vigia. Era compreensível, pois, conforme diz o próprio livro, "durante toda sua vida Russell tinha sido 'a Sociedade' ". De fato, durante décadas o 'pastor' exerceu um autêntico 'papado' entre seus seguidores. Além de ser o acionista majoritário da Sociedade - portanto, a maior autoridade civil - sua palavra era, em questões doutrinais, sempre a última. Por anos, sua literatura alimentou a crença de que ele era o 'servo fiel e prudente' de Mateus 24: 45. Menos de dois meses após sua morte, a edição de 1/12/1916 de A Sentinela, p. 357, reafirmava tal crença, sendo que sua reimpressão, p. 6159, foi mais longe ainda, comparando Russell ao apóstolo Paulo. Não eram palavras precipitadas ou emitidas sob forte emoção, pois, sete anos mais tarde, a edição de 1/3/1923 ratificou tais idéias, chamando o 'pastor' de 'escolhido'. Perante tais declarações, não é de admirar que surgisse um desmedido culto de personalidade em torno da pessoa de Russell. Evidentemente, um rebanho órfão, carente da figura de seu líder, precisava de um consolo. Este não tardaria a vir.
Já no ano seguinte ao óbito de Russell - 1917 - a famosa publicação The Finished Mistery [O Mistério Consumado], em suas páginas 144 e 256, trouxe as emocionantes palavras:
“Este verso (Revelação 8:3) mostra que, embora o Pastor Russell tenha transposto a cortina [ou morrido], ele ainda está dirigindo cada aspecto do trabalho de colheita... Nós sustentamos que ele supervisiona... o trabalho a ser feito”
Perceba o leitor que o texto não faz uso de retórica. O autor não diz que o "ânimo", o "espírito empreendedor" ou a "coragem" do falecido estavam entre os 'Estudantes da Bíblia' ou que estes se entregavam ao seu ministério com o mesmo "zelo", "diligência" ou "à moda de seu líder". Não, o comentário é feito no tempo presente e na terceira pessoa - 'ele' está, 'ele' supervisiona. E não foi uma declaração isolada. No mesmo ano, a edição de 1 de novembro de A Sentinela (p. 6161, reprints] ratificaria esta crença:
“Então nosso querido Pastor, agora em glória [morto], está, sem dúvida alguma, manifestando profundo interesse no trabalho de colheita, e Deus lhe permite exercitar uma forte influência em razão disso.”
Aqui vemos palavras praticamente idênticas, no mesmo tempo e na mesma pessoa. Não Deus, mas Russell 'está manifestando profundo interesse'. Não sua mensagem, mas ele exerce 'forte influência'. Cremos que o texto não deixa margem para se evocar o uso de uma metáfora. Nem seria preciso, pois, ambas as declarações estavam de pleno acordo com a crença da época, de que Russell, imediatamente após sua morte, seria arrebatado ao seio de Jesus Cristo, afinal ele era um 'escolhido'. Uma prova concreta disso pode ser vista até hoje na inscrição gravada em seu monumento fúnebre em forma de pirâmide:
Ao lado do tradicional símbolo da cruz coroada, os dizeres - Risen with Christ ["Levantado com Cristo"]. Portanto, o entendimento era: Russell vivia no plano espiritual e exercia influência direta nas ações da comunidade de 'Estudantes da Bíblia'. Nesse caso, um Testemunha de Jeová poderia se perguntar: qual é, essencialmente, a diferença entre essa crença e a crença espírita de que os mortos estão ativos no mundo espiritual e participam nas atividades dos vivos? Ou a crença católica de que os 'santos' podem intermediar entre os cristãos e Deus?
Este não é o único incidente envolvendo a Sociedade Torre de Vigia e as crenças relativas ao mundo dos espíritos. Seu segundo presidente - J. F. Rutherford - teve uma gestão marcada por reviravoltas doutrinárias e artigos polêmicos, alguns dos quais provocaram sucessivos 'rachas' no movimento, o que suscitou a mudança de nome da entidade para 'Testemunhas de Jeová', em 1931. Rutherford, gradualmente, transferiu para si, senão o prestígio, no mínimo, a autoridade que por anos era exclusiva do falecido 'pastor'. Deveras, durante sua presidência, coube apenas a ele a prerrogativa de legislar sobre questões doutrinais maiores. O compêndio The Messenger ["O Mensageiro"], de 21/7/1931, estampou fotos de Rutherford e, no rodapé, o título de 'líder visível' dos 'Estudantes da Bíblia', uma honraria que só não superava a de seu antecessor. Coube a ele a tarefa de negar a crença anterior sobre as 'atividades' do morto Russell:
"Ninguém da companhia do templo seria tão tolo ao ponto de concluir que algum irmão (ou irmãos) que em alguma época esteve entre eles, e o qual morreu e foi ao céu, está agora instruindo os santos na terra e dirigindo-os em sua obra." -Jehovah (1934), p. 191 (em inglês)
Aparentemente, a organização chocava-se agora frontalmente com os ensinos que ela própria advogou fervorosamente, anos antes. Se os 'Estudantes da Bíblia' tinham sido 'tolos', quem os induzira a agir assim? Contudo, este entendimento não permaneceria para sempre incólume. Em 1989, a publicação Revelation - Its Grand Climax is at Hand! ["Revelação - Seu Grande Clímax Está Próximo!"], p. 125, afirmaria:
"É apropriado que, então, aquele entre os 24 anciãos, representando ungidos já no céu, instigasse o pensamento de João... (Revelação 7: 13, 14a) Sim, aquele ancião poderia encontrar a resposta e dá-la a João. Isto sugere que os ressuscitados do grupo dos 24 anciãos podem estar envolvidos na comunicação de verdades divinas atualmente."
Ao que tudo indica - desde 1989 - considerar que alguém que morreu e foi ao céu esteja se comunicando com os vivos não é mais tão 'tolo' assim...
A exemplo de seu antecessor, Rutherford era homem de mente fértil. Coube a ele introduzir não só o nome, como a maioria das crenças atuais das Testemunhas de Jeová, diversas delas em choque frontal com o que ensinava o 'pastor' Russell. De onde provinha tal 'conhecimento'? Deixemos que o próprio Rutherford responda:
"O Juiz Rutherford fala, não a opinião dele, nem a de ninguém." - A Idade de Ouro de 28/3/1934, p. 396
"Sem dúvida, o Senhor usa seus anjos para fazer com que a verdade seja publicada em A Sentinela... Certamente, Deus guia seu povo pactuado por usar os santos anjos para levar sua mensagem a ele. - A Sentinela de 1/2/1935, p. 41
Esta declaração apresenta um nítido contraste com o ensino que o Espírito Santo - não os anjos - serviria de 'ajudador' aos cristãos (João 14: 26). Bem deixemos, novamente que o próprio Rutherford explique o ponto:
"Por seu espírito, o espírito santo, Jeová Deus guia ou lidera seu povo até um certo tempo, e assim ele fez até o tempo em que 'o confortador' foi retirado... em 1918." - Preservação (1932), pp. 193 e 194
"...1918... naquele ano o Senhor Jesus chegou ao templo de Jeová Deus. O espírito santo, o qual tinha sido o guia do povo de Deus, tendo cumprido suas funções, foi retirado..." - Salvação (1939), pp. 216 e 217
"Ao invés dos servos serem impelidos à ação pela operação do espírito santo como ajudador, as Escrituras parecem ensinar claramente que o Senhor instrui seus anjos sobre como agir e eles agem sob a supervisão do Senhor, conduzindo o restante na terra no que diz respeito à linha de ação a tomar. - A Sentinela de 1/9/1930, p. 263
"Estes anjos são invisíveis aos olhos humanos e estão lá para levar as ordens do Senhor. Indubitavelmente, eles primeiro ouvem a instrução que o Senhor lança ao seu restante e então os mensageiros invisíveis passam tal instrução ao restante." - Vindicação III (1932), p. 250
"Deus usa anjos para instruir seu povo agora na terra" - A Idade de Ouro de 8/11/1933, p. 69
Estava claro - os anjos serviam agora de mediadores entre Deus e a Sociedade Torre de Vigia. Até 1930, a organização ensinava que apenas o espírito santo podia prover o entendimento das escrituras, porém, desse ano em diante, a iluminação supostamente provinha dos anjos. Contudo, QUEM estava à frente dos ensinos que eram divulgados naquele tempo? Quem os redigia? A resposta é uma só - J. F. Rutherford. Isso não se pode negar, pois todos os livros dessa época levam a assinatura dele. Somos obrigados a deduzir, então, que os anjos revelavam as 'verdades' a ele e apenas a ele. Como prova deste ponto, vejamos o que dizia a revista A Idade de Ouro de 2 de Setembro de 1931, p. 793:
"Todo leitor de A Idade de Ouro sabe que nós consideramos os livros do Juiz Rutherford os mais importantes do mundo."
Fariam sentido tais palavras se as Testemunhas de Jeová não cressem que os escritos de seu presidente provinham de uma fonte superior, sobrenatural? Estava ou não envolvida a comunicação com o mundo espiritual?
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J. F. Rutherford - comunicação com 'anjos'? |
Vemos assim que Rutherford afirmava não ter a iluminação do Espírito Santo desde 1918, ficando inteiramente dependente da comunicação de anjos. Tais fatos têm levado alguns críticos do movimento das Testemunhas de Jeová a considerar que as declarações de Rutherford faziam dele - conscientemente ou não - um médium espírita, afinal de contas, a comunicação com anjos é parte integrante da liturgia do espiritismo, o qual vê os anjos como espíritos superiores, iluminados. Todavia, o livro Proclamadores, p. 708, diz:
"Aqueles que compõem a única genuína organização cristã hoje não recebem revelações angélicas nem inspiração divina... Jeová os conduz ou guia a esse entendimento por meio de seu espírito santo."
Em outra publicação (Despertai! de 22/5/1971, p. 28, em inglês), a organização acrescenta:
"Sim, a Bíblia mostra que não há apenas anjos bons, mas também iníquos."
Todas essas contradições certamente suscitam as seguintes questões:
a) Se o espírito santo - de acordo com a doutrina atual das Testemunhas de Jeová - é o responsável pela revelação da palavra de Deus e, tendo Rutherford declarado que este mesmo espírito havia sido removido desde 1918, então quem guiou a Sociedade Torre de Vigia entre os anos de 1918 e 1942?
b) Se foram anjos que transmitiram informações ao segundo presidente da organização, então que espécie de anjos eram esses - os 'bons' ou os 'iníquos'?
c) Se atualmente é o espírito santo que guia a Sociedade Torre de Vigia, mas - de acordo com os artigos da década de 30 - ele havia sido removido em 1918, então por que ele se retirou e quando foi que retornou?
d) Afinal, quem era Rutherford - um iluminado, um lunático ou um impostor?
Declarações exóticas não eram exclusividade do segundo presidente da Sociedade Torre de Vigia. Nesse respeito, ele tinha companhia à altura, a saber, a pessoa a quem ele nomeou para editor da revista A Idade de Ouro em 1919 - o Sr. Clayton Woodworth, o qual tinha um passado envolto em comunicações com espíritos e possessões demoníacas. Como sabemos disso? Pelo próprio depoimento dele, registrado no compêndio 1913 Convention Report [Relatório da Convenção de 1913], mencionado no início deste artigo:
" Eu gostaria de falar a vocês sobre uma coisa que eu certamente jamais pretenderia mencionar nesta convenção. Eu presumo que todos vocês tenham feito o voto; talvez alguns não o tenham feito... Então meus problemas começaram. Eu comecei a orar e a lutar ao meu próprio modo com as Escrituras. Após alguns meses, as Escrituras aparentemente começaram a abrir-se... Houve um tempo, durante cinco noites consecutivas em que eu não dormia; daí, chegou um tempo em que a tensão era demais; minha mente ficou desequilibrada e eu fiquei diretamente sob a influência de espíritos maus, tanto que, por três dias, eu estava completamente sob controle demoníaco, tanto quanto a Sra. Eddy estava quando ela escreveu 'Ciência e Saúde'.
Tais palavras certamente teriam forte impacto sobre a assistência se hoje fossem proferidas em um daqueles depoimentos pessoais realizados nas assembléias das Testemunhas de Jeová. Não era diferente em 1913 - isto pode-se perceber pela relutância inicial de Woodworth em prosseguir relatando sua experiência. A Sra. Eddy que ele menciona é Mary Baker Eddy - a fundadora da Igreja da Ciência Cristã, a qual também adotava o símbolo da 'cruz coroada'. Pois bem, teria C. Woodworth se 'curado' de suas experiências 'demoníacas' após sua conversão ao movimento 'Estudantes da Bíblia'? Embora uma Testemunha de Jeová hoje prefira crer que sim, faria bem em considerar o que o linguajar dele na literatura da organização parece sugerir. Vejamos, por exemplo, o estranho comentário dele no livro The Finished Mistery ['O Mistério Consumado'], em 1917:
"Tem você profunda apreciação por esta obra? Está você convencido que ela é do Senhor - preparada sob sua orientação? Tem você, cuidadosamente e com oração, lido os comentários em Revelação 7:1? Então agarre-se à verdade, a qual é propósito de Deus conceder brevemente às mentes de muitos de seus pequeninos até que se abra um campo de batalha, no qual os anjos caídos serão julgados, e a maneira com que enfrentaremos os testes provará nosso merecimento por coroas, ao mesmo tempo em que provará que estes espíritos desobedientes não são merecedores de vida em plano algum. Isso é algo com o qual alguns, mas não muitos, estão familiarizados... sem uma experiência real é praticamente impossível conceber a intensidade de tais lutas... a base do cérebro é presa com em um torno. Interpretações da Escritura, ingênuas, mas desencaminhadoras além de descrição, são projetadas dentro da mente como água que sai de uma mangueira. Visões podem ser experimentadas, maravilhosas iluminações da mente como que por uma suave, mas gloriosa neblina esverdeada ou amarelada. Sugestões sedutoras podem ser feitas, de acordo com as circunstâncias do ambiente. Ofertas de inspiração podem ser feitas. O privilégio de dormir pode ser retirado por dias a fio. Tudo isso com o objetivo de forçar o desgraçado a, pelo menos, uma insanidade temporária... a mente pode ser invadida por pensamentos desprezíveis além da conta. Então lembrem-se do voto."
É difícil supor que alguém, em pleno gozo de suas faculdades mentais e completamente sóbrio, emitisse os comentários acima sem por em dúvida sua sanidade ou condição mental. De fato, as palavras de Woodworth parecem psicodélicas e realmente atestam a natureza de suas experiências pessoais. Como uma Testemunha de Jeová receberia hoje tais palavras se fossem publicadas em um artigo de A Sentinela? Considerá-las-ia como normais, próprias do cristianismo ou prontamente as identificaria como contaminadas com ocultismo?
Os comentários de Woodworth sobre Revelação 7:1 são, na verdade, uma referência a artigos do 'pastor' Russell, publicados em exemplares de A Sentinela - datados de 1911 e 1914 - e diziam respeito aos dramáticos acontecimentos previstos para aquela época. Uma das citações dizia:
"Há apenas um modo, tanto quanto podemos discernir, pelo qual esses anjos caídos podem ter um julgamento, consistindo em ter uma oportunidade mais ampla para pecar, se assim desejarem, ou uma oportunidade para mostrar, caso desejem, que eles estão fartos do pecado e querem retornar à harmonia com Deus... chegamos à conclusão de que o julgamento desses anjos caídos está em um futuro próximo; talvez já tenha começado para alguns." - O Mistério Consumado (1917), p. 124
A doutrina acima é realmente bombástica, pois abre uma perspectiva inimaginável para o cristianismo ortodoxo - a reabilitação de demônios!
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C.J. Woodworth - 'Possessões demoníacas'??? |
Há um episódio que ilustra bem a crença de Woodworth em 'demônios honestos'. Trata-se de um compêndio desconhecido para a maioria das Testemunhas de Jeová hoje em dia - Angels and Women [Anjos e Mulheres], de J. G. Smith, enfaticamente recomendado pela edição de 30/7/1924 de A Idade de Ouro. Consiste, na verdade, em uma revisão de uma obra psicografada em 1878. 'Psicografado' é um termo do vocabulário espírita utilizado para designar um texto ditado por espíritos e escrito por meio de um médium. O revisor da obra era um 'Estudante da Bíblia', identificado - na p. 702 da revista - apenas como "um amigo pessoal do Pastor Russell e que estava próximo a ele em seu trabalho". O texto diz:
" 'ANGELS AND WOMEN' é o título de um livro recém-lançado. É uma reprodução e revisão da novela 'Seola', a qual foi escrita em 1878, e que trata de condições anteriores ao dilúvio. O Pastor Russell leu esse livro com muito interesse e pediu a alguns dos irmãos que lessem por causa de sua notável harmonia com o relato das Escrituras sobre os filhos de Deus no sexto capítulo de Gênesis."
O que o autor do artigo acima deixou de revelar diz respeito precisamente à origem do livro. Vejamos o que dizia seu prefácio:
"O revisor deste livro é de opinião que o manuscrito original foi ditado para a mulher que o escreveu por um dos anjos caídos, o qual desejava retornar ao favor divino."
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Anjos e Mulheres - Obra psicografada |
A doutrina de Russell sobre 'anjos caídos retornando ao favor divino' começava a dar frutos. O editor de A Idade de Ouro - C. Woodworth - aderiu tenazmente a este ensino. Este fato, aliado ao seu passado místico, tornou a nomeação dele um fator decisivo na contaminação da literatura da Sociedade Torre de Vigia, décadas à frente, com crenças ocultistas. Deveras, além do endosso a uma obra psicografada, diversas 'terapias' esotéricas - como as 'Reações Eletrônicas de Abrams ', a osteopatia e outras - 'povoaram' diversos números da revista da qual ele era editor-chefe, A Idade de Ouro.
Não tardariam a surgir questionamentos por parte dos leitores das publicações da Sociedade contra aquilo que entendiam como promoção do demonismo. A edição de 3/12/1924 de A Idade de Ouro publica uma interessante troca de correspondências entre a Sociedade e um de tais leitores descontentes. Entre outras coisas, ele dizia:
"Eu fiz algumas indagações e foi-me dito que ['Anjos e Mulheres'] era um livro que um anjo caído ditou a uma mulher, demonstrando o desejo de retornar à harmonia com Deus e que o Pastor Russell aprovou o livro. Eu nunca tinha ouvido falar deste livro antes. Já que nós devemos evitar tudo o que se relacione ao espiritismo, eu gostaria de saber com certeza se o livro tem sua aprovação..." - W. S. Davis, Los Angeles, California
Agora a organização não podia mais afirmar que não sabia da origem do livro. Vejamos a resposta da redação de A Idade de Ouro:
"Quanto a ser uma violação do juramento ler este livro, tal idéia não merece consideração. Não seria mais errado lê-lo do que ler 'O que as Escrituras Dizem sobre o Espiritismo' ou 'Falando com os Mortos', pois estes dois livros falam bastante do que os espíritos maus fazem. Muitos têm obtido bastante benefícios a partir da leitura de 'Anjos e Mulheres' porque este ajuda a adquirir uma visão mais clara sobre como Satã logrou anjos e a raça humana, causando estrago entre homens e anjos. O livro ajuda a ter um melhor entendimento da organização do diabo."
Cremos que as palavras acima dispensam comentários adicionais e servem como poderoso argumento contra as seguintes palavras:
"Já que não praticamos espiritismo, estamos livres da dominação dos demônios" - A Sentinela de 15/3/1992, p. 20
É o caso de perguntar - da dominação dos demônios maus ou dos 'honestos'?
Nem sempre os leitores insatisfeitos da publicação A Idade de Ouro foram tão solícitos. Sabe-se de, pelo menos, um episódio que teve graves conseqüências. Trata-se do caso de Roy Goodrich, uma zelosa Testemunha de Jeová que, durante a era Rutherford, combateu obstinadamente o endosso da Sociedade Torre de Vigia a 'terapias' e dispositivos, os quais, segundo o entendimento dele, estavam inexoravelmente ligados ao ocultismo. Tudo começou nos anos 20, quando a edição de 22/4/1925 (p. 454) de A Idade de Ouro apresentou a seguinte matéria:
"...A Biola Eletrônica de Rádio, a qual significa vida renovada por ondas de rádio ou elétrons. A Biola automaticamente diagnostica e trata doenças pelo uso de vibrações eletrônicas."
As primeiras décadas do século 20 foram marcadas pelo charlatanismo em assuntos médicos. Toda sorte de 'geringonça milagrosa' ou 'terapia revolucionária' ocupava as páginas da imprensa. Foi a 'era de ouro' dos charlatões e 'magos'. Convidamos o leitor a aprofundar-se nessa matéria visitando o endereço http://www.geocities.com/torredevigia/medicos.htm . Pois bem, o artigo acima citado representa o endosso da Sociedade Torre de Vigia a uma das terapias esotéricas em moda naquela época. Já na edição de 2/2/1921 (p.260) de A Idade de Ouro, Clayton Woodworth atribuía a descoberta do elemento radium à revelação dos 'anjos caídos' de que já tratamos neste artigo. Neste artigo, ele chega a afirmar - referindo-se aos demônios - que "até os mentirosos falam, às vezes, a verdade". A seguir, na edição de 23 de junho do mesmo ano (pp. 606 e 607), deu ampla publicidade a uma tal 'almofada rádio-solar', com a qual Rutherford havia se tratado com êxito de uma pneumonia. A partir daí, instalou-se uma busca febril pela nova 'máquina' - chamada 'osciloclasto', 'dinamizador' ou 'biola'. Seu inventor, Albert Abrams, lançou a pitoresca teoria das 'Reações Eletrônicas de Abrams' - ou ERA, como ficou conhecida. O dispositivo baseado nessa 'teoria' supostamente era capaz de diagnosticar doentes em exame direto ou à distância, pelo uso de uma foto, uma amostra de sangue e coisas assim. Algo semelhante à hidroscopia - uma prática ainda comum em certas partes do mundo, na qual a pessoa, fazendo uso de um pedaço de madeira em forma de 'Y', tenta captar as 'vibrações' dos lençóis freáticos e localizar água subterrânea.
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Albert Abrams - para a ciência, um charlatão, |
para a Torre de Vigia, um sábio |
A partir de 1928, após familiarizar-se com a ERA, Roy Goodrich concluiu tratar-se de puro ocultismo, tais como as pranchetas Ouija, e iniciou uma campanha solitária contra os dispositivos baseados nesta teoria pseudo-científica e - segundo ele - demoníaca. Isto lhe custaria sua excomunhão. Em sua obra Demonismo e a Torre de Vigia (1969), ele relata sua experiência:
"Por quase dois anos eu tinha tentado ser ouvido pelo Juiz Rutherford ou por alguém na sede central, para pararem com a promoção do demonismo na revista 'A Idade de Ouro' e por representantes da Sociedade; o tipo de coisa - descobri - à qual pioneiros 'fracos' estava aderindo... Tudo o que eu tinha conseguido era uma repreensão do juiz Rutherford... Da convenção da Filadélfia, em novembro de 1929, eu viajei para Brooklyn com o objetivo definido de conseguir uma audiência com o Juiz. Após breves cumprimentos e formalidades, [ele] falou: 'Bem, irmão Goodrich, o que você tem em mente?'; quando eu mencionei o nome 'Abrams', ele exaltadamente respondeu: -'Foi para isso que você veio até aqui?!' Com igual força e entusiasmo, eu repliquei, 'Já chega, senhor!!! O que, em sua opinião, é mais perigoso para os ungidos de Deus: o espiritismo ou o alumínio?' "
Aqui, Goodrich estava se referindo à famosa campanha da Sociedade Torre de Vigia contra o alumínio, empreendida nos anos 20 e 30. Ele via uma estranha lógica em uma organização que, mesmo contra todas as evidências científicas, atribuía ao uso do alumínio em utensílios de cozinha toda sorte de moléstia, e, ao mesmo tempo, aprovava e recomendava o uso de dispositivos cientificamente inócuos e claramente ligados ao ocultismo.
Ao final desta audiência - prossegue o relato - o 'juiz' aceitou o desafio e ditou a sua secretária uma carta para ser entregue a Clayton Woodworth, informando-o de que o irmão Goodrich iria escrever um artigo sobre a ERA, omitindo nomes e lugares, o qual seria publicado em A Idade de Ouro. A matéria saiu na edição de 5/3/1930. Nela, ele declara:
"Neste artigo, fornecerei provas de que a 'Máquina de Diagnóstico do Dr. Albert Abrams' nada mais é do que uma complexa prancheta 'Ouija'; que esta dita máquina de diagnóstico não poderia ser usada para diagnosticar doenças, a menos que seu operador seja um médium espírita." (p.355)
Mais adiante, ele classifica tal dispositivo de 'esperto instrumento do Inimigo' e 'impostura pseudocientífica de puro demonismo' (p. 361). Para provar seu ponto, ele descreve toda uma suposta 'consulta' com um 'especialista' ao qual muitos 'pioneiros' estavam recorrendo e chama a atenção dos leitores para os passos místicos do tal 'tratamento', como mandar alguém escrever seu nome em um pedaço de papel enquanto o 'terapeuta' tenta captar as 'vibrações' do paciente. Estava-se diante de uma estranha 'máquina' que 'lia' saliva ou sangue com a mesma facilidade que um nome. O autor do artigo atacou desdenhosamente aquilo que ainda era endossado pela Sociedade Torre de Vigia. Goodrich conclui seu protesto, dizendo: "Já é mais do que tempo para os 'Estudantes da Bíblia' reconhecerem e rejeitarem este laço espírita de Satã!"
Os anos não tardariam a desmascarar Albert Abrams - sua máquina não passava de pura fraude e os 'diagnósticos' obtidos jamais provieram do emaranhado de fios que ele criou. Se houve outra fonte - a fantasia dos adeptos ou a comunicação com forças ocultas - caberia a cada um estabelecê-la, de acordo com suas convicções pessoais. Entretanto, pergunte-se o leitor: se uma pessoa lhe pedisse para escrever um nome em um pedaço de papel e tentasse captar suas 'vibrações', consideraria tal 'terapeuta' como um profissional médico ou um místico?
A resposta da Sociedade veio em A Idade de Ouro de 30/4/1930 (p.483), na pessoa de uma adepta da ERA e da 'osteopatia' (também desmascarada como fraude), a 'Dra.' Mae J. Work. Na introdução, Clayton Woodworth declara que a palavra dela teria caráter definitivo:
" 'A Idade de Ouro' solicitou à Dra. Mae J. Work que respondesse ao artigo, e a resposta aqui é fornecida. Isso vai encerrar a controvérsia, tanto quanto interessa a esta revista."
A 'Dra.' Mae não refutou os argumentos de Goodrich - disse apenas que o que ele presenciou nada tinha a ver com a verdadeira 'teoria' do Dr. Abrams ; que havia pessoas inescrupulosas fazendo mal uso dela; que o dispositivo que ela usava era ligado a uma tomada e que realmente produzia uma quantidade mensurável de energia. Assim, a Sociedade Torre de Vigia, pelo menos por algum tempo, 'salvava' o caráter 'científico' da ERA perante a comunidade de 'Estudantes da Bíblia', os quais continuaram consumindo o produto.
Em seu livro, Roy Goodrich expressa a opinião de que o objetivo de Rutherford era fazê-lo cair em descrédito, pois não houve tréplica e o prestígio da 'Dra.' Mae em 'Betel'- mesmo estando totalmente equivocada - pesou contra ele. Além do aparelho fraudulento de Albert Abrams, ela também abraçou a pitoresca cruzada contra o alumínio e chegou a anunciar que o câncer era causado por ele, podendo ser curado pela ERA. Os conselhos 'médicos' da 'Dra.' Mae não merecem ser discutidos...
A história ainda não tinha acabado. Nos anos 40, chegou ao conhecimento de Roy Goodrich que as 'terapias' baseadas na ERA estavam em pleno uso na sede de 'Betel', desta vez administradas pelo Dr. M. A. Howlett no atendimento a um 'betelita' chamado Chester Nicholson. Sua metodologia era a mesmíssima que Goodrich já havia denunciado, anos antes. Dessa vez, ele enviou cartas ao próprio Dr. Howlett, aos diretores e ao presidente Nathan Knorr. A resposta de Howlett foi lacônica: "O senhor, evidentemente, está mal informado quanto à minha ligação com a ERA. Nada sei sobre ela e nunca a usei. Não existe tal coisa em 'Betel' ". Em 9 de junho de 1943, Goodrich enviou nova correspondência a Howlett, informando-o que, desde 1922, os dispositivos da ERA eram, de fato usados na sede da Sociedade, pela 'Dra.' Mae, a autora da réplica em A Idade de Ouro ; que, tendo ele ingressado em 'Betel' bem antes disso, era um absurdo dizer que jamais ouvira falar de tal coisa. A essa altura, Goodrich acreditava que o Dr. Howlett não falara a verdade. Assim, enviou correspondência, também datada de 9 de junho, ao presidente Knorr. Em um trecho de sua réplica a Howlett , Goodrich diz:
"...Com todo respeito, então, irmão Howlett, a lógica inescapável dos fatos é que seu cartão postal a mim corresponde a uma das duas coisas, a saber: (1) Uma mentira potencialmente maliciosa ou (2) uma admissão perante o Senhor de que está praticando demonismo e tentando se 'safar'... um médium espírita em 'Betel' só pode ser uma pessoa 'insana'." - Trecho impresso na obra 'Bethel Rides the Broom', de Roy Goodrich
As cartas aos diretores e ao presidente foram igualmente duras em seus termos. O resultado era previsível - Roy Goodrich foi desassociado ("excomungado"). A Sociedade Torre de Vigia jamais se retratou publicamente pelo seu endosso a fraudes científicas e crenças ocultistas. Curiosamente, cerca de uma década mais tarde, ela começou a publicar artigos críticos à ERA, contendo as mesmas conclusões às quais Goodrich tinha chegado anos antes e pelas quais havia sido desassociado. Naturalmente, nenhum crédito foi conferido a ele. Poderíamos chamar isso de 'percepção tardia'???
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J. Greber - médium espírita e ex-padre |
Johannes Greber foi, por décadas, um padre católico até que, por volta dos 48 anos de idade, teve uma experiência mística que o impeliu na direção do espiritismo. Seu depoimento acha-se registrado em A Sentinela de 1/10/1956, p. 187, parágrafos 10 e 11:
"Diz Johannes Greber no prólogo da sua tradução do Novo Testamento, direitos autorais de 1937: 'Eu mesmo fui sacerdote católico, e até os quarenta e oito anos de idade nem mesmo tinha crido na possibilidade da comunicação com o mundo dos espíritos de Deus. Veio, porém, o dia em que dei voluntariamente o primeiro passo para tal comunicação, e tive a experiência de coisas que me abalaram até as profundezas de minha alma... Minhas experiências estão relatadas num livro... A Comunicação com o Mundo Espiritual: Suas Leis e Finalidades'... No prefácio do seu livro... Greber disse: 'O mais destacado livro espírita é a Bíblia.' Sob essa impressão, Greber esforça-se para fazer que sua tradução do Novo Testamento soe bem espírita... É bem claro que os espíritos nos quais o ex-padre Greber crê lhe ajudaram na sua tradução."
Repare o leitor a riqueza de detalhes com que a Sociedade Torre de Vigia descreve a trajetória de Greber, deixando bem claro qual a fonte de 'inspiração' dele em sua tradução do Novo Testamento. Conforme vemos no cabeçalho desse artigo, C. T. Russell - em uma edição de 1879 de sua revista Zion´s Watch Tower - disse, "uma verdade apresentada por Satanás é tão verdadeira quanto uma verdade declarada por Deus... Aceite a verdade onde quer que a encontre...". Trata-se de uma concepção de 'verdade' bastante incomum para um cristão. Até porque as Escrituras contêm relatos sobre Satanás falando ocasionalmente a verdade, porém sempre distorcendo-a com propósitos nefastos. Por exemplo, Lucas 4: 10 mostra o diabo citando de forma verdadeira o Salmo 91: 12, de modo a desencaminhar Jesus Cristo. Talvez os sucessores de Russell tenham se inspirado na filosofia de seu mestre de uma forma inesperada.
Cerca de seis anos após ter seus dados biográficos publicados em A Sentinela, J. Greber voltaria a freqüentar a literatura das Testemunha de Jeová, dessa vez, não pejorativamente, mas como uma autoridade em grego - evocada para dar apoio à forma da Sociedade Torre de Vigia traduzir o texto bíblico de João 1:1 em sua versão das escrituras, a Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas (TNM), lançada na década de 50. Alvo de severas críticas por parte de muitos peritos em línguas mortas, seus editores puseram-se em busca de apoio para ela em tantas versões quanto possível, algumas vezes com o prejuízo da respeitabilidade das fontes escolhidas, no que diz respeito à sua erudição. A edição de 15/9/1962 de A Sentinela, p. 554 (em inglês), cita Greber como se ele fora um perito respeitável. Também nesse ano, a publicação A Palavra - Quem é Ela de acordo com João, p. 5, confirmaria este mesmo ponto de vista. Vejamos, agora, o que diz a publicação Certificai-vos de Todas as Coisas..., lançada em português em 1970 (1965, em inglês), p. 487:
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"Certificai-vos..." - J. Greber citado como autoridade acadêmica |
No texto acima, a obra de Greber - The New Translation and Explanation - é citada como apoio para a TNM na controversa passagem do evangelho de João. Obviamente, a organização o citou por ele ser anti-trinitarista - uma postura em comum com as Testemunhas de Jeová - desconsiderando a fonte da qual Greber obtinha sua interpretação das escrituras. Esta não foi a última vez que a organização recorreu a ele. No livro Ajuda ao Entendimento da Bíblia, lançado em português em1983 (1971, em inglês), p. 1245, lemos:
"Uma tradução feita pelo ex-sacerdote católico romano, Johannes Greber (ed. 1937) traduz a segunda ocorrência da palavra 'deus' na sentença como 'um deus'."
A obra Ajuda... nada mais é do que a sucessora da publicação Certificai-vos..., agora na forma de um extensivo dicionário bíblico, como seu lançamento noticiado na mídia. Era de se esperar que seus editores tivessem revisado detidamente a publicação anterior, de modo a incluir novas referências e a checar as antigas. Em outras palavras, a obra mais recente propunha-se a ser, em todos os sentidos, o aprimoramento da primeira. Seria uma oportunidade para os editores redimirem-se de qualquer equívoco. Mas não foi assim - a referência a uma obra reconhecidamente 'psicografada', o Novo Testamento de Greber, permanecia em voga, remetendo-nos aos tempos em que a revista A Idade de Ouro - sob a supervisão de Clayton Woodworth - recomendava a leitura de Anjos e Mulheres. Entretanto a história ainda não havia terminado...
Em uma seção Perguntas dos Leitores de A Sentinela de 1/10/1983, p. 31, vemos uma interessante explicação:
"Por que, nos últimos anos, A Sentinela não tem feito uso da tradução feita pelo ex-sacerdote católico, Johannes Greber? [Resposta] ...como indicado no prefácio da edição de 1980 de 'O Novo Testamento' de Johannes Greber, este tradutor confiou no 'Mundo Espiritual de Deus' para... traduzir passagens difíceis... 'A Sentinela' julgou impróprio fazer uso de uma tradução que tem tal vínculo estreito com o espiritismo."
A justificativa acima poderia ser plausível, caso a própria organização não tivesse - como vimos - publicado, em 1956, o conteúdo do prefácio da edição de 1937, onde Greber deixava claro que sua obra era 'psicografada'. Além disso, o primeiro uso da tradução dele distava apenas seis anos desde a primeira referência a ela, com as publicações de 1962, 1965 e 1971, tendo vigorado por cerca de duas décadas. Agora a organização menciona o prefácio da edição de 1980, como se jamais tivesse tido conhecimento daquela de 1937. Mas isso não foi tudo...
Em 20 de dezembro de 1980, a Sociedade Torre de Vigia enviou uma correspondência em papel timbrado, endereçada à Fundação Memorial Johannes Greber, confirmando o recebimento do Novo Testamento - edição de 1980 - e do livro Comunicação com o Mundo Espiritual de Deus, mencionado no artigo de 1956. Estranhamente, a mesma organização enviou a uma irmã de nome Helen McAllister - a qual havia solicitado o endereço da fundação acima mencionada - outra correspondência, datada de 21 de setembro de 1981, na qual afirma dispor apenas do endereço antigo, disponível na edição de 1937. Em 27 de setembro de 1982, outro leitor, Kurt Goedelman, enviou uma carta à organização expondo o caráter público e notório dos trabalhos mediúnicos de Greber, desde a década de 30, e confrontando a organização com o fato de ela fazer uso do Novo Testamento dele desde os anos 60. Nenhuma resposta chegou às suas mãos...
Recapitulemos os fatos até aqui:
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Em 1956, a Sociedade Torre de Vigia lança uma matéria informando que o Novo Testamento de Greber - edição de 1937 - era uma obra 'psicografada', pois o autor era um médium espírita declarado.
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Apenas seis anos mais tarde, em 1962, menciona sob luz favorável a obra dele - em A Sentinela e em um folheto - pois harmoniza-se com a tradução de João 1: 1 feita pelas Testemunhas de Jeová.
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Em 1965, evoca novamente a mesma obra na publicação Certificai-vos... como apoio para a Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas .
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Em 1971, mantém a referência à tradução de Greber na publicação revisada e melhorada, Ajuda ao Entendimento da Bíblia.
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Em 1980, faz um pedido da última edição do Novo Testamento de Greber e de seu livro Comunicação com o Mundo Espiritual, confirmando seu recebimento em carta timbrada.
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Em 1981, responde a uma leitora afirmando que não possui a edição mais recente, mas apenas a antiga - de 1937 - na qual consta o endereço antigo.
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Em 1983, afirma em Perguntas dos Leitores que parou de utilizar a tradução de Greber após tomar conhecimento que a obra era 'psicografada', na edição de 1980 - a mesma que negou possuir na correspondência a Helen McAllister.
À base dos eventos acima descritos, podemos estabelecer as seguintes hipóteses:
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Os redatores da Sociedade Torre de Vigia não são rigorosos na verificação das credenciais das fontes citadas, antes de usá-las em apoio de suas doutrinas. Isto põe em cheque a credibilidade de suas citações.
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Os redatores sabem da origem objetável das citações, mas, mesmo assim, as publicam para dar crédito às suas doutrinas. Isto põe em cheque sua honestidade.
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Os redatores faltam para com a verdade quando ela é danosa à reputação da organização. Isto seria parte da assim chamada "Estratégia Teocrática de Guerra" - mencionada em A Sentinela de 1/5/1957, p. 285 (em inglês) - um artifício que visa a confundir os 'opositores', ocultando-lhes a verdade.
Cremos que qualquer uma das três hipóteses acima depõe seriamente quanto à imagem moral daquela que sustenta ser "a única genuína organização cristã na atualidade". É claro, restaria ainda uma última hipótese, embora pouco provável - tudo não passaria de um engano, isto é, algum redator colocou por equívoco o nome de Johannes Greber na lista de referências sem consultar o artigo de 1956 - portanto, sem se assegurar de suas credenciais antes de publicar seu nome - e outros só copiaram a citação, repetindo o erro. Se isso for verdade, então cai por terra a tese - sustentada até hoje pela organização - de que tudo o que é publicado pela Sociedade Torre de Vigia é orientado pelo Espírito Santo e fornecido como 'alimento espiritual' puro e no 'tempo apropriado'. Insistir com essa teoria após tantas trapalhadas só resultaria em escárnio sobre o Espírito Santo, já que, sob 'orientação' dele, não se poderia chegar a erros crassos.
Em face das contínuas citações de Johannes Greber por parte da Sociedade Torre de Vigia, no tocante à tradução de João 1:1, achamos conveniente verificar se havia mais pontos em comum entre as doutrinas dele e aquelas divulgadas na era Rutherford, quando tanto Greber quanto o segundo presidente da Sociedade Torre de Vigia estavam em plena atividade. A doutrina de Greber acha-se registrada em seu livro Comunicação com o Mundo Espiritual (1932) e as de Rutherford , na literatura que ele publicou de 1917 a 1942. Os resultados são surpreendentes:
a) Ambos diziam receber instruções do mundo espiritual - Greber, dos 'espíritos bons' e Rutherford, dos 'anjos'.
b) Ambos ensinavam que Deus tem um corpo e, portanto, não é onipresente (A Idade de Ouro de 16/1/1924, p. 253).
c) Ambos ensinavam que Deus não é onisciente, delegando a criaturas celestiais a incumbência de observar e registrar ações e características humanas (Consolação de 23/3/1938, p. 4).
d) Ambos rejeitavam totalmente a doutrina da trindade (Riquezas, 1936, pp. 185, 188).
e) Ambos ensinavam que Cristo foi a primeira criação de Deus (A Harpa de Deus, 1921, p. 98).
f) Ambos ensinavam que os anjos Miguel e Lúcifer eram irmãos (A Sentinela de 1/3/1932, p. 76).
g) Ambos ensinavam que há salvação para demônios (A Idade de Ouro de 9/5/1923, p. 508 e 30/3/1932, p. 390).
h) Ambos ensinavam que Cristo não ressuscitou em seu corpo carnal, mas materializou-se e apareceu àqueles que o seguiam (A Harpa de Deus, 1921, pp. 166-168).
i) Ambos rejeitavam completamente a doutrina do inferno de fogo (Criação, 1927, p. 273).
j) Ambos defendiam a tese de que houve uma adulteração do texto de Mateus 27: 52,53 (A Idade de Ouro de 17/4/1929, p. 478)
k) Ambos ensinavam que as verdades de Cristo foram obscurecidas e seriam restauradas no devido tempo (A Idade de Ouro de 21/8/1929, pp. 761, 762).
Tantas similaridades entre os ensinos de Rutherford - os quais ele dizia provirem dos 'anjos' - e os ensinos de Greber - os quais ele dizia provirem de 'espíritos bons' - levaram alguns investigadores da história da Sociedade Torre de Vigia a estabelecer a tese de que ambos - e não apenas Greber - eram médiuns, afinal de contas, diversos de seus ensinos básicos eram idênticos e oriundos - de acordo com as declarações deles próprios - do plano espiritual. Estariam recebendo 'instruções' da mesma fonte?
O livro Anjos e Mulheres (1924) e o Novo Testamento de Johannes Greber (1937) não são as únicas obras 'psicografadas' que foram endossadas pelas Testemunhas de Jeová. Em uma publicação menos conhecida, a Tradução Interlinear do Reino (1985), pp. 1139 e 1140, outra 'autoridade' em grego é mencionada como fonte de apoio para a tradução de João 1:1. Trata-se de John S. Thompson. Uma consulta à obra dele, The Monotessaron, or The Gospel History, According to the Four Evangelists (1829), revela que toda sua inspiração provinha do mundo espiritual. Mais um incidente com o ocultismo...
Até que ponto a Sociedade Torre de Vigia tinha consciência da mediunidade deste segundo autor, pode-se apenas conjeturar. Todavia, fica bem evidente que, na sôfrega busca por apoio à sua forma bastante peculiar de traduzir certos textos bíblicos, a organização 'atropelou' as credenciais de suas fontes de apoio e acabou por 'atolar' várias vezes no 'pântano' do ocultismo, ao qual, paradoxalmente, se diz contrária em todos os sentidos. É como se o 'fantasma' de um passado distante teimasse em retornar...
Os dois termos acima dificilmente seriam familiares ao leitor. Ambos definem ciências ocultas - o primeiro define aquela que tenta determinar o caráter e as habilidades de uma pessoa pelos acidentes anatômicos do crânio, e o segundo define uma outra bastante similar, a qual julga as pessoas por seus traços faciais. A história da frenologia remonta ao século 18, quando foi criada por Franz Joseph Gall (1758-1828). Tanto a frenologia como a fisiognomia já foram totalmente desmascaradas, não havendo nelas qualquer caráter científico. Todavia, nos anos 20 e 30 não foram poucos os que se deixaram seduzir por elas. Entre estes, estavam os dirigentes da Sociedade Torre de Vigia. Uma edição de 1925 da revista A Idade de Ouro defendia a tese de que "o caráter de um homem pode ser descrito em termos de características faciais, o que se conhece como Fisiognomia, ou pelas características cranianas, uma área definida pelo termo científico de Frenologia". O artigo prosseguia afirmando que tais características contam "nossa história de vida" e, juntamente com as 'vibrações' do corpo, "mostram o que somos e não mentem". As 'vibrações' às quais o artigo se referiam estavam relacionadas à infame teoria do Dr. Albert Abrams, já estudada neste artigo. Desse modo, por combinar os 'princípios' da frenologia, fisiognomia e das 'Reações Eletrônicas de Abrams', os redatores da Sociedade Torre de Vigia produziram uma autêntica 'salada' de pseudociência com ocultismo.
Quase nenhuma Testemunha de Jeová hoje sabe que o fundador do movimento, C. T. Russell, submeteu-se ele próprio a 'exames' frenológicos, cujos resultados foram publicados na biografia dele, escrita por William Wisdom, em 1923. Nela, consta o testemunho de vários frenologistas atestando o papel fundamental de Russell à frente de sua organização. Um deles, de nome David Dall, examinou o 'pastor' em 30 de novembro de 1911 e chegou a um análise reveladora - Russell tinha uma grande cabeça e "um cérebro dotado com um grau incomum de atividade; uma região basilar inteira é acompanhada pela poderosa dotação da natureza moral, intelectual e espiritual". As pitorescas conclusões de Dall - conhecido como um 'notável cientista mental' - foram complementadas por um 'diagnóstico' segundo os 'princípios' da fisiognomia: "uma larga face, um nariz grande e largo, com amplas narinas", bem como olhos que " comunicam disposição e benevolência... como faculdade diretriz... manifestando-se em generosidade de sentimento a toda humanidade, profundo desejo pelo bem-estar de outros, combinando calor de simpatia com uma rara simplicidade de propósito".
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Russell - uma 'grande cabeça'??? |
É realmente impressionante como um 'leitor de faces', a partir de um exame anatômico possa chegar a conclusões tão lisonjeiras. Mais impressionante ainda é que uma organização que se autodenomina "o único canal de comunicação entre Deus e a humanidade" tenha se deixado levar por tais sandices em uma época em que elas já tinham sido contestadas pela ciência. Há, contudo, um agravante: tais crendices tinham suas raízes tanto em uma interpretação equivocada da teoria da evolução das espécies - combatida pelas Testemunhas de Jeová - como na eugenia, a saber a crença no aprimoramento genético das raças. Diversos adeptos de doutrinas racistas assentaram suas teorias sobre os princípios da frenologia e da fisiognomia. Por exemplo, uma adepta da bruxaria, Sybil Leek, em sua obra intitulada Frenologia (1970), ressaltou os atributos da raça branca, tomando como base as medidas e características do crânio caucasiano. Sem dúvida, algumas de suas conclusões teriam soado como 'música' aos nazistas.
Um exame na literatura da Sociedade Torre de Vigia, durante as décadas de 20 e 30 revela o amplo destaque dado à frenologia e à fisiognomia. Vejamos, por exemplo, o que diz - A Idade de Ouro de 19/1/1921, pág. 224 (em inglês):
"O tamanho do nariz, e também o tamanho dos olhos, não são sem significado. Um homem de nariz pequeno não pode ter uma mente judicial, não importa que outras virtudes tenha. E um homem de nariz arrebitado não pode administrar justiça mais do que um buldogue pode ser pastor."
Outra edição da revista (5/7/1928) chegou a dizer, "que bênção seria se pais, mestres, educadores, médicos e outros, estivessem plenamente informados quanto à interpretação das formas físicas, da fisiognomia e, particularmente da Iridiagnose, de modo a que pudessem com, com muita antecedência, detectar doenças em evolução e assim tomar medidas em tempo hábil para preveni-las". Seria hilariante saber o que "pais, mestres, educadores e médicos" pensariam hoje de tais conselhos. Todavia, não percamos de vista o fato de que eles provieram de uma organização que se dizia a única detentora da iluminação divina para restabelecer "verdades" sobre os mais diversos aspectos da vida dos cristãos hodiernos. É, deveras, desconcertante que a 'direção' do espírito santo não a tenha impedido de ser levada, junto com muitos outros, na correnteza das superstições. Apenas em 1978, a Sociedade Torre de Vigia expressou formalmente - em sua literatura - a desaprovação da frenologia, sem, contudo, dar uma só palavra sobre o amplo destaque que concedeu, por décadas, a essa e outras fraudes ocultistas.
O 'pastor' Russell considerava a telepatia como um fenômeno real, muito embora não arriscasse um palpite sobre a natureza dela. Em uma reimpressão de A Sentinela, ele expressa seu ponto de vista:
"Quanto a como as preces de alguém podem beneficiar outro, não podemos saber. Não temos informação suficiente para filosofar sobre isso muito profundamente. Nós poderíamos conjeturar certas influências mentais provindo de uma pessoa para o outra, exatamente como sabemos de influências elétricas que procedem de uma estação para outra distante milhares de milhas. Os poderes da mente são algo não compreendido. Uma mente pode influenciar outra sem palavras, por algum poder telepático."
A relutância de Russell em assumir uma postura definida sobre a telepatia abriu campo para que seus seguidores prosseguissem investigando-a em busca de sua real natureza. Em 1925, a revista A Idade de Ouro - edição de 25 de fevereiro - publicou o artigo "O Poder da Mente", da autoria do Dr. A. P. Pottle. Em um trecho do artigo, ele diz:
"Está demonstrado que as substâncias químicas são muito lentas para permitir cálculos rápidos, e isso prova que o pensamento é conduzido por um sistema de vibração eletrônica. O Dr. Abrams foi o primeiro a demonstrar essa teoria por meio de um instrumento mecânico. Também explica aquilo que até agora se considerava o mistério da assim chamada telepatia, leitura de mentes e intuição feminina, dos quais o Pastor Russell falou em algumas ocasiões."
Aqui vemos, mais uma vez, o apoio expresso à teoria estapafúrdia do charlatão Albert Abrams, desta vez, elevando-a à condição de verdadeira 'pedra filosofal' - a descoberta que explicaria todos os fenômenos paranormais. Mais adiante, o autor separa inteiramente a 'técnica' de Abrams dos fenômenos demoníacos e alerta os leitores quanto ao perigo desses últimos. Não é de admirar que, uma vez tendo encontrado uma forma 'segura' de captar as 'vibrações' mentais - aquela que põe as pessoas a salvo das influências malignas - os redatores da Sociedade Torre de Vigia fossem tomados de um empolgação incomum pelas ondas de rádio. A ignorância deles não só serviu de combustível para a promoção de dispositivos inócuos, com muitos prejuízos ao bolso (foram anunciados ao preço de 35 dólares) e à saúde, como expôs a comunidade de 'Estudantes da Bíblia' à exploração de charlatões e místicos.
A edição de 1 de julho de 1925 de A Idade de Ouro (p. 631) publicou um artigo ainda mais curioso, intitulado "Cada Humano como um Aparelho de Rádio". Nele, Clayton Woodworth introduz:
"Nós estamos recebendo recortes intitulados, 'São as Ondas de Rádio Mentais uma Possibilidade?' e 'Retratos do vazio', os quais relatam as experiências de diversas pessoas em receber, com ou sem aparatos, quadros e mensagens que eles não conseguem explicar. Eu não tenho dúvida, é claro, de que os fenômenos aqui listados são, em larga medida, demoníacos, mas eu também estou seguro de que nem todos o são. De fato, este recorte esclareceu alguns mistérios para mim... os seres humanos por todo o universo serão capazes de conversar uns com os outros à vontade, instantaneamente, e sem instrumentos de qualquer sorte... todo ser humano é um embrião de estação de rádio..."
A ignorância científica de Woodworth, bem como sua crença incondicional nos ensinos de Russell certamente contribuíram para que ele endossasse algumas fraudes científicas de seu tempo. Nessa condição, era também pouco provável que ele conseguisse discernir a linha divisória entre ficção científica e ocultismo. É lamentável que ele, estando na posição de editor-chefe de uma publicação que era considerada um 'instrumento do Senhor' - publicada por uma organização 'messiânica' - atraísse muitos 'Estudantes da Bíblia' para o contato com aquilo que diziam repudiar, o ocultismo. Talvez isso nos ensine uma lição sobre o risco de alguém se por diante de homens para lhes obedecer, tornando-se, por conseqüência, 'escravo' deles (Romanos 6: 16).
É irônico que o poder de influir na mente de outros, entendido por 'Woodworth e Cia' como 'ondas de rádio', fosse exercido por eles próprios - não por estações 'virtuais' - mas pelo poder da palavra escrita. Talvez o único poder mental que tinham era o de convencer milhares a os acompanharem em seus delírios religiosos.
Os redatores da Sociedade Torre de Viga parecem alimentar, há décadas, uma fascinação mórbida por espíritos iníquos. Fizemos uma retrospectiva, desde os tempos de Russell, Clayton Woodworth e J.F. Rutherford, na qual constatamos a publicação freqüente de matérias sobre os demônios e suas 'atividades'. As coisas não mudaram muito nesse respeito - o diabo ainda ocupa lugar de destaque na literatura da Sociedade Torre de Vigia. A figura dele tem sido utilizada como pretexto para explicar toda sorte de mazela - desde guerras, problemas econômicos, índices de criminalidade até o surgimento de setores descontentes com as doutrinas da instituição. Diferentemente de seu fundador, as Testemunhas de Jeová não pregam mais a salvação para demônios arrependidos nem ensinam que haja demônios 'honestos'. Ao contrário, afirmam taxativamente que toda e qualquer comunicação oriunda do plano espiritual na atualidade provém inexoravelmente de Satanás. O livro Conhecimento que Conduz à Vida Eterna (1995) afirma, na p. 112, o seguinte:
"Jeová enviou espíritos bons, ou anjos justos, para comunicar-se com alguns seres humanos antes de a Bíblia ser concluída. Desde que foi terminada, a Palavra de Deus dá aos seres humanos a orientação necessária... Ele não passa por alto sua Palavra sagrada dando mensagens a médiuns. Todas essas mensagens atuais do mundo dos espíritos vêm de espíritos iníquos."
Não se pode deixar de perceber o notável contraste entre a visão acima e os tempos em que o segundo presidente da Sociedade Torre de Vigia alegava receber mensagens dos anjos. Isso levanta uma questão perturbadora: se, desde a conclusão das Escrituras Sagradas, por volta de 98 DC, Deus não mais envia quaisquer instruções aos seres humanos, então de onde provinham as revelações de Rutherford, as quais alimentaram as gráficas da organização por mais de vinte anos e fazem parte do atual corpo doutrinário da religião?
Na atualidade, as Testemunhas de Jeová entendem que, não só as mensagens mediúnicas propriamente ditas, mas toda e qualquer manifestação sobrenatural é, necessariamente, demoníaca - incluindo-se as manifestações carismáticas ou pentecostais, bem como quaisquer 'milagres' ou 'aparições' de 'santos'. Sua literatura contém diversos relatos de ex-pentecostais, ex-médiuns e ex-macumbeiros agora convertidos, os quais relatam experiências assustadoras de vozes, ruídos, possessões e fetiches demoníacos que tiveram de ser destruídos às pressas. Livros, fotos ou roupas que não queimavam, quadros ou amuletos quase indestrutíveis e coisas assim, povoam o imaginário das Testemunhas de Jeová. Por exemplo, ainda no livro Conhecimento..., p. 115, lemos:
"...um casal na Tailândia há muito tempo era molestado pelos demônios. Daí, eles se livraram de objetos relacionados com o espiritismo. Com que resultado? Ficaram livres dos ataques demoníacos e depois fizeram progresso espiritual.
A organização publicou diversos artigos sobre como lidar com objetos 'demonizados', visões e outras manifestações, chegando a 'diagnosticar' insônia, dores-de-cabeça e 'vozes' como provenientes de uma maldição sobre uma peça de roupa presenteada ou ornamentos, após cuja destruição, os 'sintomas' cessaram totalmente (A Sentinela de 1/12/1974, p.707-712; 15/4/1984, pp. 11-15; 15/8/1963, pp. 507-511). Também advogou a idéia de que os demônios praticam abuso sexual e levam pessoas à loucura (livro Conhecimento..., p. 114). Por outro lado, na publicação Despertai! de 22/8/1975, pág. 26 (em inglês), a Sociedade Torre de Vigia desaconselha a consulta a psiquiatras ou psicólogos, recomendando o uso da Bíblia para auxiliar pacientes com problemas psicológicos.
Com relação à destruição de objetos, a organização costuma fazer referência à passagem bíblica de Atos 19: 19, onde se narra que cristãos recém-convertidos queimaram seus livros de ocultismo. Todavia, o texto não diz que eles o fizeram em razão de algum poder emanar daqueles objetos. Tampouco relata que tenha havido alguma dificuldade para destruir tais itens. Aparentemente, as Testemunhas de Jeová ampliaram o sentido do texto de Atos, criando uma variada 'lista' de objetos a serem localizados e destruídos:
"...Isto inclui livros, revistas, vídeos, pôsteres, gravações musicais e objetos usados para fins espíritas. Estão incluídos também ídolos, amuletos e outras coisas usadas para dar proteção, e presentes recebidos de praticantes do espiritismo." - Livro 'Conhecimento que conduz...' (1995), p. 115
Note o leitor que a Sociedade recomenda a busca e destruição, não apenas dos objetos diretamente ligados ao ocultismo - ou usados em alguma liturgia - mas até mesmo um simples presente dado por alguém que professe o espiritismo, mesmo que o objeto em si nada tenha a ver com tais práticas. Em outras palavras, se um parente espírita vai a um shopping-center e compra um par de meias para presentear generosamente alguém, elas devem ser destruídas, pois podem servir de elo com os demônios. Tal atitude se assemelha de perto àquela dos religiosos da era medieval, à caça de bruxas. A organização cita os textos de Deuteronômio 7: 25,26 e 1 Coríntios 10: 21 como justificativa para esta doutrina. Entretanto, tais textos referem-se explicitamente a ídolos - objetos diretamente relacionados a uma prática condenável, a idolatria. Nenhuma das duas passagens citadas nem o relato de Atos 19: 19 atribuem qualquer propriedade maligna intrínseca a tais objetos. Ao contrário, o Salmo 115 retrata os ídolos como uma coisa inerte, sem poder algum, e Paulo, em 1 Coríntios 8:4 fala que 'o ídolo nada é'. Assim sendo, tais utensílios devem ser destruídos pelo que representam, e só. A superstição de sair à procura de objetos pessoais como fonte de fenômenos sobrenaturais está bem mais próxima do folclore religioso (Xamanismo) do que da fé cristã e, no caso da Sociedade Torre de Vigia, parece mais indicar vestígios da antiga fascinação dos redatores de A Idade de Ouro [atualmente Despertai!] por demônios, 'honestos' ou não.
Infelizmente, a 'espiritofobia' atualmente manifesta entre as Testemunhas de Jeová serviu para agravar o estado mental de pacientes psicologicamente abalados. Alguns, supondo estarem à mercê de demônios, saíram a destruir livros, rosários, cruzes, adornos e quaisquer objetos 'demonizados'. Os que obtiveram alívio - ainda que por fatores psicossomáticos - presumem agora que os objetos eram a causa, porém, os que não melhoram supõem que ainda resta algum fetiche a ser destruído - talvez um "presente recebido" - e, caso não o encontrem, seu estado mental poderá se agravar. Episódios assim induziram certos especialistas a estudar a ocorrência de perturbações mentais entre as Testemunhas de Jeová e alguns são de opinião que casos de depressão, neuroses e comportamento compulsivo ou esquizofrênico são mais comuns entre elas do que na população em geral. Algumas obras já foram publicadas nessa área, entre elas, Jehovah's Witnesses and the Problem of Mental Health [As Testemunhas de Jeová e o Problema da Saúde Mental], publicada, em 1992, pelo psiquiatra e ex-adepto das Testemunhas, Jerry Bergman. Outro especialista, Havor Montague, em seu trabalho The Pessimistic Sect's Influence on Mental Health: The case of Jehovah's Witnesses [A Influência Pessimista das Seitas na Saúde Mental: o caso das Testemunhas de Jeová], afirma que trabalhou com "muitos casos nos quais a sugestão de 'influência demoníaca' tinha sido o fator crucial para fazer a Testemunha neurótica piorar ao ponto de tornar-se completamente psicótica" (p. 144).
Na edição de A Sentinela de 1 de maio de 1984 (p.24, em espanhol), sob o título "Cuidado com a Música que Degrada", o autor declara:
"Também foram feitas gravações de mensagens antibíblicas, e até demoníacas, mediante uma técnica de gravar dissimuladamente de trás para frente, a qual vários grupos musicais utilizam... [uma] gravação popular, tocada ao contrário, traz a mensagem: 'Cantarei porque vivo com Satanás... É inevitável, meu doce Satanás." Supõe-se que as pessoas normalmente não toquem discos ao contrário. Porém, quando se escuta certo tipo de música, a mente fica exposta a sugestões impróprias e pode absorver idéias antibíblicas ou demoníacas... A mente desprevenida em sentido espiritual pode deixar a pessoa exposta às influência de demônios."
A partir dos comentários acima, a Sociedade Torre de Vigia demonstra que está bem a par da existência daquilo que se denomina 'mensagem subliminar', a qual consiste na introdução sutil de informação oculta em qualquer via de comunicação, seja som ou imagem. Na publicação Despertai! de 22 de setembro de 1994 (pp. 7-8), a organização volta a abordar o assunto, dessa vez atacando a música tipo 'rock pesado', classificando-a como um instrumento a serviço do satanismo. Na idade média acreditava-se que uma das características dos bruxos era a habilidade de falar de trás para frente. No século 20, a técnica de introduzir mensagens gravadas ao contrário na música (backward masking) é uma prática que data dos anos 60, tendo servido a diversos objetivos, desde simples brincadeira até propósitos escusos. Comenta-se que até os Beatles lançaram mão deste recurso (final da canção I´m so Tired, 1969). Na Bulgária, o uso de áudio com mensagens subliminares foi aplicado à aprendizagem de idiomas e matemática. Todavia, como dissemos, as mensagens subliminares não freqüentam apenas o áudio, mas também o vídeo. Alguns pesquisadores afirmam que o uso de figuras subliminares remonta ao renascimento, desde os afrescos da capela cistina, pintados por Miguelângelo. Elas também foram supostamente encontradas em diversas obras de artistas famosos. Até em anúncios publicitários modernos, há rumores do uso deste recurso. Diz-se que, na década de 50, os fabricantes de Coca-Cola introduziram imagens de seu produto - a uma duração de um trigésimo de segundo cada uma - em uma película cinematográfica exibida em New Jersey, o que supostamente resultou em um incremento de 58% nas vendas.
A forma como a mente humana reage a mensagens subliminares foi objeto de estudo de alguns médicos desde os tempos de Sigmund Freud - o conhecido 'pai da psicanálise'. Um contemporâneo dele, o Dr. Poetzle, realizou experimentos e registrou suas conclusões sobre o efeito das mensagens subliminares sobre o ser humano. Em 1957, a obra Hidden Persuaders [Persuasivos Ocultos] - de Vance Packard - deu grande destaque ao tema, sendo recebida inicialmente com certo ceticismo. Entretanto, alguns anos depois, a atitude do público mudou e, de lá para cá, muito já se escreveu sobre o tema. O assunto despertou o interesse de psicólogos e de autoridades. Muitos têm questionado a ética em aplicar tal recurso, já que, segundo se sabe, a mensagem captada de forma tão sutil, pelo subconsciente de cada um, poderia escapar ao senso crítico da vítima, transmitindo-lhe de forma eficaz idéias que ela, de outro modo rejeitaria.
O artigo de maio de 1984 de A Sentinela não seria o único daquele ano a tratar deste assunto. A edição de 1 de setembro (p. 20, em inglês) anunciou o seguinte:
"Até as publicações da Sociedade Torre de Vigia têm sido objeto de rumores - por exemplo, de que um dos artistas havia estado introduzindo secretamente figuras de demônios nas ilustrações, tendo sido subseqüentemente pego e desassociado... Certamente, o rumor a respeito das publicações da Sociedade foi danoso, bem como calunioso."
A matéria acima refere-se a denúncias - ou rumores, como prefere o autor - de que, em diversas figuras publicadas na literatura das Testemunhas de Jeová, podiam-se distinguir imagens subliminares, sutilmente introduzidas com algum propósito. Produto da imaginação de alguns ou não, o fato é que tais 'rumores' vieram de diversas partes do mundo. Trata-se de matéria polêmica, tendo, de um lado aqueles que afirmam que tudo não passa de coincidências e, do outro, os que sustentam que a freqüência com que se têm encontrado tais figuras é demasiado alta para deduzir que se trate de simples acaso. A organização não mais pronunciou-se sobre a questão. Todavia, em pelo menos alguns casos, o ceticismo cede lugar ao questionamento ou, pelo menos, a suspeita. Algumas figuras foram alteradas ao serem lançadas em exemplares de outras línguas ou foram reformuladas ao serem exibidas em outras publicações. 'Com qual finalidade?', pergunta-se. Outras ilustrações parecem adquirir formas fantasmagóricas, relacionadas ao ocultismo. Seria pura coincidência? É um tema aberto à discussão. Convidamos o leitor a visitar um endereço que trata detalhadamente deste curioso tema e tirar suas próprias conclusões. Trata-se de um site em espanhol - http://www.geocities.com/Athens/Ithaca/5974/subliminal1.html . Lá, um artigo, escrito originalmente em francês, disseca os fundamentos dessa área de estudo e contém farta galeria de fotos - aquelas que motivaram a discussão. A razão de mencionarmos tal assunto é por ele guardar estreita relação com o objeto de investigação deste artigo.
É certo que toda Testemunha de Jeová hoje em dia busca - a exemplo dos membros de outras denominações cristãs - manter-se longe de qualquer forma de ocultismo, fazendo-o com sinceridade. Mas também é certo que a esmagadora maioria delas desconhece completamente o passado duvidoso de sua organização. Elas desconhecem a formação mística do fundador de seu movimento, C.T. Russell ; desconhecem seus vínculos com organizações esotéricas; desconhecem seu envolvimento com astrologia ; desconhecem sua doutrina sobre a salvação de demônios ; desconhecem seu envolvimento com frenologia e fisiognomia ; desconhecem seu túmulo adornado por uma pirâmide e ao lado de um complexo maçônico; desconhecem o teor de seus discursos junto à Pirâmide de Gizé e na Loja Maçônica de Pasadena ; desconhecem o significado dos diversos símbolos esotéricos utilizados pela organização ao longo de sua história; desconhecem o passado de possessões demoníacas do editor-chefe de uma das revistas da Sociedade Torre de Vigia; desconhecem a teoria da retirada do espírito santo em 1918; desconhecem a tese da comunicação com anjos; desconhecem o endosso de dispositivos inúteis e ligados ao ocultismo; desconhecem o endosso de obras 'psicografadas'; desconhecem, enfim, os mais graves episódios em que sua instituição esteve em pleno 'romance' com o oculto.
Tem sido política da Sociedade Torre de Vigia rejeitar instituições, folclore, símbolos, costumes ou tradições com base exclusiva em suas origens primitivas. Essa é a razão pela qual as Testemunhas de Jeová são impedidas de entrar em qualquer templo religioso que não o seu próprio ou de participar de celebrações como Natal, Dia das Mães ou dos Pais, Dia dos Namorados ou aniversários natalícios. O caráter fraterno dessas ocasiões não conta, é sobrepujado por sua 'origem'. Da mesma forma, as Testemunhas rejeitam associar-se à Cruz Vermelha ou quaisquer organizações filantrópicas que tenham uma origem, ainda que remota, questionável sob o ponto de vista de sua organização. Isso é visto, entre elas, como evidência do mais alto grau de pureza cristã. A organização enfatiza repetidamente esta filosofia. Todavia, tal mentalidade, se aplicada à risca, acabaria por lançar vitupério sobre as próprias Testemunhas de Jeová, pois, além do uso de símbolos como a torre de vigia (originalmente ligada ao ocultismo), elas também portam objetos como aliança de casamento - também de origem pagã. Na verdade, se fôssemos em busca da origem de cada termo ou utensílio do nosso cotidiano, muito freqüentemente os encontraríamos vinculados à cultura de nações ditas 'pagãs'. Se os rejeitássemos sistematicamente por este motivo, cada aspecto de nossa vida - de vocabulário a vestuário - seria sobrecarregado de restrições sem sentido, o que talvez inviabilizasse a vida em sociedade. Como diz Ray Franz, em sua obra In Search of Christhian Freeedom [Em Busca de Liberdade Cristã], p. 274:
"Muito é feito da 'origem pagã' de várias práticas e itens ligados a alguns feriados. Ainda assim,sendo realísticos, qualquer significado 'pagão' que possam ter tido, este já desapareceu há muito tempo... os dias da semana envolvem nomes de objetos pagãos de adoração, o sol, a lua, e deuses e deusas... O mesmo se dá com os nomes dos meses. Mesmo assim, nós hoje empregamos estes nomes sem a menor noção de sua 'origem pagã'. Na verdade, a maioria das pessoas estão totalmente inconscientes de sua fonte 'pagã'. Isso é similarmente verdadeiro com respeito as várias decorações e costumes relacionados a muitos feriados. Enquanto coloca grande ênfase no fator 'origem pagã', a Sociedade Torre de Vigia simplesmente releva isso em outras áreas..."
As Testemunhas de Jeová não se apercebem de que, ao rejeitarem certas coisas com base exclusiva no critério da 'origem pagã', ao passo que deixam passar diversas outras, estabelecem aquilo que se convencionou chamar 'dois pesos e duas medidas'. Deveras, a organização parece instituir até hoje dois critérios - um para avaliar a si própria e outro para avaliar as demais instituições. Costumes populares - totalmente incorporados à cultura dos povos -, bem como denominações religiosas devem ser rejeitados por causa de sua origem pagã, mesmo que tal fonte há muito tenha sido esquecida. Por outro lado, a Sociedade Torre de Vigia, nascida do Adventismo do século 19, do esoterismo de Russell, da piramidologia, das mensagens 'angelicais' de Rutherford, das idéias surreais de Clayton Woodworth e da simbologia pagã da maçonaria e de outras sociedades esotéricas, deve ser aceita plenamente - sem se tomar em conta seu passado comprometedor e sua 'origem pagã'. Se seus adeptos não mostrassem para com ela mais benevolência do que ela própria tem para com outras denominações, dificilmente haveria hoje milhões de Testemunhas de Jeová pelo mundo. Certamente é um direito delas desconsiderar o passado de sua religião como é direito de milhões de membros de outras denominações religiosas desconsiderar o passado da religião delas. Todavia, entendemos que a ignorância do passado inexoravelmente compromete a lucidez da escolha, pois como perdoar se não se sabe o quê? Como avaliar se a decisão que se tomou - às vezes com conseqüências vitalícias - foi acertada se faltaram subsídios vitais para a sua formulação e a fonte que deveria prover tais subsídios, na verdade, obscureceu sua percepção?
Cremos que os fatos aqui expostos têm muito que ver com a vida de cada Testemunha de Jeová e talvez suas graves implicações induzam pessoas sinceras a reconsiderar sua postura diante da religião que abraçaram - até porque, cremos, relevantes fatos que teriam sido incorporados ao processo de conversão delas foram, até a leitura deste artigo, completamente omitidos ou 'pasteurizados' sob uma ótica piedosa e provincialista. Diversas questões - diante do que foi visto - deveriam vir à mente:
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Teriam as verdades do primitivo cristianismo sido 'revividas' no final do século 19, por meio de uma organização infestada de paganismo, tradições mundanas e símbolos ocultistas?
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Teria Cristo, ao observar todas as religiões do mundo, no período de 1914 a 1918, escolhido para representá-lo - dentre milhares - justamente uma que ensinava piramidologia, advogava o perdão para demônios, combinava cristianismo com astrologia, celebrava feriados supostamente pagãos, mantinha laços estreitos com a maçonaria e com seus símbolos místicos e induzia milhares a acompanhá-la em suas superstições antibíblicas?
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Teria o Espírito Santo de Deus 'dirigido' uma organização que professava não ter, desde 1918, a sua iluminação?
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Teria Cristo mantido sua bênção sobre a organização que o representava, enquanto ela "comia à mesa de demônios", endossando crenças e práticas ocultistas por mais de 50 anos?
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Se um cristão sincero, tomando conhecimento da existência de tais práticas, 'tropeçasse' em sua fé e rejeitasse à organização, a quem caberia a responsabilidade - a Cristo ou à própria Sociedade Torre de Vigia?
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Pode uma religião que 'brotou' de tal solo contaminado ser hoje a 'única genuína organização cristã'?
Estas são, certamente questões que merecem a mais relevante consideração. Jó 14: 4 diz: "Quem pode, de alguém impuro, produzir alguém puro? Nem sequer um." Cremos que, ante os fatos, o leitor já tem, por si mesmo, condições para avaliar com lucidez os pontos acima e discernir se a luz pode, afinal, provir da escuridão, pois o apóstolo João dizia:
"...Deus é luz e não há nenhuma escuridão em união com ele." - 1 João 1: 5
Fonte: http://testemunha.cjb.net/